Pense no seguinte: você está há tempos desejando que uma determinada coisa aconteça. Depois de muita intenção e ação, a meta é alcançada. Você fica em êxtase. Logo, vem o medo de que aquela configuração se desfaça. Ansiedade. A vontade é de fotografar a nossa vida, naquele instante, para que tudo permaneça como está.
Agora, faça o exercício trazendo à cena sentimentos lidos como negativos. Angustiada, você está no centro de um drama qualquer. Sente no fundo do peito uma tristeza aguda. Quer, a todo custo, que aquilo seja extraído. Entra em desespero. Lembra de alguém que disse que isso também vai passar, mas se questiona: por que não passa agora?
Nosso cotidiano está intimamente ligado à variância do mundo. Nada é permanente ao longo do tempo. Causas e condições mudam constantemente numa dança que temos pouquíssimo controle. Olhar para a impermanência, portanto, pode ser um caminho para não mergulharmos em bolhas de sofrimento — seja por querermos estabilizar as coisas para que não mudem, seja por desejarmos ser catapultados para fora de um sofrimento qualquer.
“A gente tem uma tendência de viver tudo mais na frente. Você sai do presente e está vivendo um futuro. Não está nem aqui, nem lá: não está em lugar nenhum.”
Conversamos com a praticante do Centro de Estudos Budistas Bodisatva (CEBB) Cláudia d'Almeida sobre o conceito de impermanência e sobre como ela pode ser uma arma poderosa para que olhemos para a finitude com um outro brilho.
Stela Santin, também do CEBB, compartilhou com a Comum algumas práticas para contemplarmos a impermanência. Recursos simples, que você pode aplicar no dia a dia, e que trarão benefícios imensuráveis.
Sentar por alguns minutos — cinco, dez, 15 — e apenas tentar existir. Focando na respiração. Na meditação, não acontece nada, não há nada a se esperar. Lembrar, ao final da prática, que podemos sempre voltar para esse espaço, esse lugar interno estável, em que é possível nos encontrarmos conosco mesmas.
Quando algo sair do planejado, contemplar que, na verdade, nada acontece exatamente como gostaríamos. Mesmo quando é algo positivo.
Quando você estiver em uma bolha de sofrimento intenso, lembre-se que muita gente também está passando por isso. Trazer à memória essa humanidade compartilhada nos faz perceber que nada é eterno. Nem a dor.
Em casos específicos de luto, em que tentamos congelar pessoas e situações, vale voltar à consciência de que estamos meio sozinhos desde sempre. Chegamos aqui sozinhos, iremos embora sozinhos.
Não é um conceito fácil, mas se o espreitarmos com atenção e presença, teremos a possibilidade de olhar para as mortes — das pequenas à grande — com mais lucidez. Isso, por si só, já é um benefício e tanto.
Gabrielle Estevans é jornalista, editora de conteúdo e coordenadora de projetos com propósito. Nessa trilha, é editora-chefe, participante e caseira.