Ser mãe não é fácil. Uma pesquisa recente apontou que só 9% das mulheres se identificam com a imagem da mãe que aparece na mídia e 70% se sentem julgadas ou cobradas o tempo todo. E o que a gente faz para se desafogar no meio dessa frustração?
A gente arruma um tempinho para sair com as amigas, namorar um pouco, fazer um curso. A gente merece e precisa. Deixamos nossos filhos com as avós, que amam estar com os netos, e tudo parece resolvido. Mas será que essa avó não tinha planos? Não ia sair com as amigas, namorar um pouco ou fazer um curso? Será que ela, vendo nosso cansaço e lembrando da exaustão que sentia quando era mãe, nos contaria caso tivesse?
Eu fui criada bem próxima a minha avó paterna. Ela morava com a gente e passava o tempo todo comigo e meu irmão. A outra avó, reza a lenda, disse que não iria cuidar de nós, que ela tinha as coisas dela e não podia oferecer todo o tempo e atenção que a gente precisava. Eu, como neta, achei aquilo um absurdo. Ela não podia dedicar tempo a nós. O que era mais importante do que nós, os netos? Hoje a resposta é bem clara: a vida dela.
Avós são mulheres. Mães são mulheres. São pessoas. E pessoas têm planos, sonhos, desejos, vontades, compromissos. Nada disso diz que pessoas não amam pessoas, só diz que cada um tem que escolher sua prioridade. Ao escolher uma coisa abre-se mão de outras. A vida é assim.
Depois que conheci o feminismo passei a entender melhor essas escolhas. Nos fazem acreditar que nosso maior papel no mundo é procriar e cuidar. Cuidar de nós, do companheiro, dos filhos, dos netos, da casa, dos animais de estimação, do jardim... Mas e se a gente não quiser cuidar de nada além de nós mesmas?
O feminismo busca, entre outras coisas, liberdade para que mulheres decidam o que querem fazer da sua vida sem o determinismo que a sociedade nos impõe. Nós lemos, discutimos, participamos de grupos e tentamos nos empoderar... mas esquecemos de outras mulheres?
De que adianta podermos ser mães, profissionais e mulheres se isso significa que estamos colocando outras mulheres em uma posição de opressão?
Faz sentido a gente se emancipar e explorar outras de nós? Seja uma empregada doméstica que faz muito mais do que limpar ou nossas mães que tentam nos ajudar e aceitam abrir mão da própria vida por nós. Esse é o mundo que queremos construir?
Ok, é difícil viver sem a ajuda de outras pessoas, mas que tal deixar a criança com o pai? Que tal dividir as tarefas domésticas – aqui tem um guia – e desafogar sua vida? E se você combinar com uma amiga que também tem filhos um esquema de rodízio? Ou deixar sua mãe ou sogra como a última opção para “babá” de emergência?
Você já conversou com sua mãe sobre a rotina dela? Sonhos? Desejos? Coisas que ela gostaria de fazer? Como anda a vida amorosa dela? Ela é mulher, assim como você. Ela sente as mesmas coisas, passa pelos mesmos desafios e está passando por um momento que costuma ser bem difícil para mulheres: envelhecer. Se chegar aos 30 pode ser um problema, imagina chegar aos 60?
Nada disso quer dizer que sua mãe ou sogra não possam ficar com os netos de vez em quando. Quer dizer que ela não precisa ficar sempre, que você pode checar se ela tem planos antes de contar o quanto você precisa de ajuda e que visitar os avós tem que ser algo prazeroso, não um quebra galho.
Se o seu feminismo te liberta, mas aprisiona outras mulheres, não há algo errado com ele?
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Autocompaixão para mulheres: a primeira trilha da Comum
A trilha da Comum desse mês é sobre autocompaixão e autonomia afetiva pra mulheres. Vamos explorar o tema juntas, através de textos, vídeos, conversas no fórum e práticas. A trilha começa nessa semana, com esse texto, e estará disponível integralmente só pras assinantes. Se quiser saber como se tornar uma e participar dessa trilha e das próximas, clica aqui e vem com a gente.
Carol Patrocinio é jornalista e divide seu tempo entre escrever para diversas publicações sobre assuntos relacionados ao mundo feminino e ao feminismo, seu canal no Medium e consultorias para negócios que querem falar com as mulheres.